Ideal do Eu e Eu Ideal...o que é isso?


Aquela frase "nenhum homem é uma ilha" bem que poderia ter sido dita por Freud. Não foi. Foi o poeta inglês John Donne no século XVII. Mas nem por isso ela não deixa de ser uma verdade psicanalítica.

Nascemos em sociedade. Vivemos em grupos. Construímos nossa identidade, portanto, a partir do outro. Já de saída lidamos com expectativas das pessoas mais próximas que nos fazem as funções parentais, esse conjunto de projetos e esperancas em nós que chamamos em psicanálise de Ideal do Eu. Esse nosso Eu se vê desde a tenra idade pressionado a dar conta do desejo de outros. Já nascemos com nome, carreira idealizada, vida projetada. E não é fácil, porque não há um ser no mundo que consiga alcançar esse Ideal plenamente.

Crescemos e vamos saindo do primeiro grupo a que pertencemos para formar outros grupos, laços e ter outros projetos. A educação da família, a escola, as convenções sociais, tudo isso se junta a aspirações e visão de nós mesmos que vamos formando, aquilo que queremos ser por nós mesmos, o que não desejamos: esse é o nosso próprio Eu Ideal.

Nossa formação como sujeitos da vida passa desde muito cedo pela constituição do nosso narcisismo, aquele amor próprio que, se for de menos ou demais, tende a nos meter em enrascadas. No Ideal do Eu dos primeiros anos de vida formamos nosso narcisismo primário, aquele que vem diretamente das expectativas do outro pra nós; passamos o tempo fazendo gracinhas para alimentar o desejo do outro, e também o nosso: fazemos tudo para voltar a sentir o calor do corpo, ouvir a voz amorosa. A gente deseja, portanto, é o desejo do outro, que nos deseja como centro do universo, sua majestade, nós, o bebê.

Mas a vida não é fácil. Temos que imergir no mundo para criar nossa própria escrita de vida, e ver se o que escreveram pela gente ainda no útero é o que realmente irá nos guiar pela vida.

Sim e não.
Sim porque precisamos de referências para termos nosso próprio horizonte. Não porque faremos muitas coisas diferentes do que planejaram pra nós.

Vivemos, então, numa luta entre nosso Ideal do Eu forjado pelo outro, a familia, e o Eu Ideal, esse que a gente constrói com as próprias mãos, nosso narcisismo secundário.

Esses conceitos complexos da psicanálise são, na verdade, o que vivemos na vida. O nosso questionamento principal: viver ou agradar o outro? Ser sujeito da existência ou objeto apenas. Somos as duas coisas. Vamos alternando entre Ideal do Eu e Eu Ideal. A alternância pode ser uma coisa proveitosa, porque nos movemos. Estagnar numa única posição com certeza pode ser o que adoece. Ser eternamente o bebê da família nos deixará mimados e isso não nos trará crescimento; mas recusar totalmente essa herança pode nos deixar num imenso vazio. A escolha é nossa.
Psicanálise pura e simples assim.

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