RELACIONAMENTO NOS TEMPOS ATUAIS: AINDA É POSSÍVEL?

Receber amor é a coisa mais desejada pelo ser humano. Desde muito pequenos nos identificamos às figuras de pai e mãe ou quem quer que faça essa função pelo amor que recebemos, ou mesmo pelo amor negado. Se recebemos, nos sentimos plenos e felizes; se nos é negado, podemos passar uma vida esperando alguma migalha de amor e fazemos jogo com isso ou mesmo podemos repetir o papel daquele que nega amor.

De toda forma, o modelo familiar tem coordenadas culturais que dão muito do tom do que se chama de amor. O amor romântico não existiu até o século XVII, por exemplo. Casamento era negócio entre famílias.

Hoje estamos passando por profundas transformações na configuração cultural dos relacionamentos amorosos. Nas gerações de nossos avós e pais, as mulheres eram submetidas a casamentos infelizes sem poder se separar porque a sociedade as consideraria meretrizes. Poucas furaram esse bloqueio e pagaram o preço por isso.

As meninas eram ensinadas desde a tenra infância (arrisco dizer que em muitas famílias ainda são) a cuidar de uma família a qualquer custo. Os meninos já aprendiam que seriam chefes da casa e que chorar era sinal de fraqueza, acumulando emoções dentro de si e não dividindo suas dores. Claro que isso não podia funcionar ad eternum, pois esse modelo engessa subjetividades e desejos, torna todos prisioneiros de alguma forma.

Veja, cuidar da família é algo que pode ser prazeroso de verdade. Mas cuidar e ser cuidado é melhor ainda.

Mas, vivemos ainda numa sociedade onde o peso das tarefas domésticas e emocionais recai muito mais sobre as meninas e mulheres. As próprias mães reproduzem isso quando mandam suas filhas arrumarem a casa enquanto seus filhos estão na sala ou no quarto jogando videogame ou vão sair com os amigos, ou mesmo quando a filha escuta "seu irmão pode, porque ele é homem". Com certeza, o resultado disso será mulheres ressentidas e homens sem espírito colaborativo, o que estraga a possibilidade de empatia dos dois lados.

Há uma ou duas gerações atrás os homens eram provedores, e parece que só cumpriam essa função. Todo o trabalho da criação de filhos e manutenção da casa cabia às mulheres. Caminhamos um bocado desde lá, mas ainda não atingimos o ideal, que é a divisão igualitária de atribuições dentro de uma família. Mulheres não se sentiam amadas e homens se sentiam indiferentes. Claro que existiam e existem exceções, mas é só para demonstrar como somos levados pela cultura muitas vezes sem perceber.

Com a liberação feminina, a entrada massiva no mercado de trabalho e o desejo da mulher posto na mesa, as coisas se modificaram. Mulheres passaram a ter opinião, pagar as contas, o que causou um alvoroço no modelo "caso contigo e você vai criar nossos filhos". Não mais. Hoje há uma urgência de se levar em conta a posição de cada um no casal, e já este e nem mesmo as famílias possuem mais um modelo tradicional, mas têm inúmeras configurações: há mães solo, duas mães, dois pais, pais solo, avós e tios, madrinhas e padrinhos que assumem funções parentais. Isso com certeza muda todo o cenário.

Mas isso tudo pra dizer o quê? Que no intuito de nos libertarmos das amarras dos séculos passados, podemos estar dando pouco valor às relações amorosas. Antigamente se aturava tudo em nome da moral e dos bons costumes. Hoje, em nome da liberdade parece que não estamos aturando nada: uma toalha molhada em cima da cama é motivo de sair da relação. "Me chamou de chata e não te quero mais". "Sua mãe não gosta de mim então a gente não pode ficar junto". "Se seu ex marido for na sua casa buscar as crianças eu saio". E por aí vai.

Há que se ter cuidado para não se perder um grande amor por motivos pífios. Claro que problema recorrente de caráter pode ser um sinal de que o relacionamento não vai dar certo. Estamos aqui falando das picuinhas do dia a dia que podem ser resolvidas, mas que muita gente supervaloriza e por qualquer louça  sem lavar na pia quer se separar porque também acha que só tem direitos.

Direitos e deveres fazem parte dos relacionamentos amorosos. É preciso que haja acordo, conversa, a famosa DR para que coisas bobas não virem motivo de estresse que leve a um rompimento desnecessário. Então, qual a medida? Creio que é um não se sentir sobrecarregado pelo outro ao ponto de ir ficando infeliz perto da hora de estarem juntos em casa. Amor é difícil? É. Mas é pra trazer paz mesmo se passar por turbulências, não pra instalar um clima de guerra.

Psicanálise pura e simples assim.
Crica Viegas

Comentários

Jane Quelhas disse…
Obgda Crica, excelente texto! Vou compartilhar e TB mostrar para o meu casal de filhos! Importante para os dois! Bjsss

Postagens mais visitadas deste blog

DERMOGRAFISMO - O MOTIVO DO SUMIÇO

O QUE DEIXEI PRA TRÁS EM 2010

O TRANSTORNO DA SÍNDROME DO PÂNICO