"MAS EU CRIEI TODO MUNDO IGUAL..."

Sinto em te dar uma notícia: não criou não. Essa nossa justificativa defensiva só aparece na hora que o couro come. Na hora que dá ruim. Tipo aquela outra frase típica de pai e mãe: "olha o que SEU filho fez"... como se a humanidade gerasse bebês só por um sexo.

Ninguém que tenha mais de um filho consegue criar todo mundo do mesmo jeito ou amar todo mundo igual, pelo simples fato de cada um é um. Cada filho tem características próprias, personalidade, trejeitos, intelecto... cada um tem um tempo de assimilar, de processar, de elaborar. E, desde recém-nascidos, ensinamos comandos a quem nos cuida; os adultos costumam pensar que só eles ensinam. Ledo engano.

Mesmo para quem é filho único tem a frase "não te criei pra isso", "não foi isso que eu te ensinei", que também vale para irmãos. Podemos dizer que a educação tem o nível macro, dos valores e princípios gerais de cada família, de cada núcleo, aqueles que são as bases. E tem o nível micro, onde cada um vai resolver o que faz com esse curso intensivo de sobrevivência  na selva da vida dado pela sua família.

E é aí que surgem as frases contrariadas dos pais, pois tendem a esquecer que cada um tem um jeito peculiar, uma identificação ou ausência dela com coisas que os pais acham importantes. Claro, a educação serve para nos civilizar e amenizar nossa barbárie, já dizia Freud. Ela vem como um abafado na chama alta de cada um, mas a brasa continua lá.

Tem também o fato de que muitas expectativas dos pais são de realização própria na figura dos filhos, e isso gera muita confusão, pois esses seres que vieram depois não têm que pagar a conta de frustrações dos primeiros. A mãe que não pode ser bailarina não pode querer forçar a filha ou o filho a aulas de balé que de repente eles detestam só porque quer se realizar neles. O pai não pode querer que seus filhos sejam gênios em português ou física só porque ele foi na época de escola. Eles podem repetir aptidões dos pais? Podem. Mas não precisam.

E é isso que começa a dar confusão porque querer se realizar através do outro é um peso que ele não vai conseguir carregar e pode terminar com ódio de quem ele queria amar. Que pai ou mãe deseja o ódio de quem gerou?

Educar é algo como governar, que Freud e Lacan disseram ser da ordem do impossível. Simplesmente porque pessoas não são adestráveis como pobres animais num circo dos horrores, aliás.
Os pais educam, e devem fazê-lo. Mas ninguém possui bola de cristal para saber o que o outro vai se tornar, pelo simples fato de que são pessoas. E pessoas são imprevisíveis, mais cedo ou mais tarde.

Psicanálise pura e simples assim.
Crica Viegas

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